O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, nesta quarta-feira, um projeto de lei que visa a regulação econômica das big techs. A proposta, elaborada pelo Ministério da Fazenda, busca estabelecer regras para empresas com faturamento bilionário e para aquelas consideradas “sistemicamente relevantes” no mercado de mídias digitais. O principal objetivo é conceder mais poder ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para que o órgão atue preventivamente contra abusos.
Atualmente, o Cade só pode agir depois que um caso de violação da concorrência é identificado. Com o novo texto, a ideia é que o órgão possa estabelecer uma regulação prévia para as plataformas.
A proposta de lei estabelece uma série de obrigações para as empresas de grande porte:
- Transferência de dados: Oferecer ferramentas gratuitas para que os usuários finais possam transferir seus dados.
- Interoperabilidade: Fornecer mecanismos para que seus serviços sejam gratuitos e efetivamente interoperáveis.
- Acesso a dados: Permitir que usuários profissionais e empresariais tenham acesso a dados e ferramentas de medição de desempenho de seus produtos e serviços.
- Configurações padrão: Oferecer opções para que os usuários finais alterem as configurações padrão dos serviços.
- Reclamações: Criar mecanismos eficazes para lidar com reclamações e disputas de usuários.
- Não discriminação: Oferecer seus produtos e serviços em condições de acesso isonômicas e não discriminatórias.
O projeto também proíbe práticas que limitem ou impeçam a participação de concorrentes em mercados nos quais as big techs atuam ou em mercados adjacentes.
O projeto de lei visa fortalecer o papel do Cade, que passará a fiscalizar a atuação econômica das empresas digitais. Para isso, o órgão ganhará uma nova estrutura, a Superintendência de Mercados Digitais. Essa superintendência será comandada por uma pessoa com mais de 30 anos, “reconhecido saber jurídico ou econômico e reputação ilibada”.
Segundo André Gilberto, CEO da área concorrencial da CGM Advogados, o Cade é o órgão mais capacitado para essa função. “Se há algum órgão da administração pública que tem expertise para fazer a regulação de mercados digitais, é o Cade”, afirma. No entanto, ele ressalta que o órgão não tem a estrutura necessária no momento para assumir essa responsabilidade, o que pode levar tempo para ser construída.
Uma das grandes preocupações do projeto de lei são as práticas de “autofavorecimento”. Esse é o caso de empresas que, por meio de seus algoritmos ou políticas, priorizam os próprios produtos ou serviços em detrimento de concorrentes. Exemplos incluem a exigência da Apple para que transações no iOS sejam processadas pelo Apple Pay ou o favorecimento de produtos da Amazon em seus resultados de busca.
Nos Estados Unidos, essas práticas já são alvo de investigações. No Brasil e na União Europeia, o movimento é de endurecer a regulação contra as big techs, o que contrasta com a abordagem mais “amigável” adotada pelo governo dos EUA. “Será interessante observar como essas duas visões vão coexistir nos próximos meses, considerando que são companhias de atuação global”, conclui Gilberto.