O candidato chega à entrevista com o currículo em ordem, um perfil profissional bem construído e experiência relevante. Ainda assim, algo não parece funcionar — a conexão esperada com o recrutador não acontece. Em situações como essa, a imagem pessoal pode estar influenciando a percepção silenciosamente, antes mesmo que o primeiro argumento profissional seja apresentado.
O conceito de “currículo invisível” está ligado à forma como nos apresentamos visualmente no ambiente de trabalho. Isso inclui não apenas o vestuário, mas também postura, expressões e outros elementos não verbais que compõem a comunicação visual. Especialistas em imagem defendem que, no mercado atual, é essencial alinhar essa comunicação com o cargo e com a cultura da empresa onde se busca uma oportunidade.
“Primeiro a gente precisa entender se é uma empresa mais tradicional, mais formal, qual é o dress code da empresa”, explica Graice Reis, consultora de imagem. “Estamos em um momento em que as empresas estão até em colapso nesse sentido. Depois da pandemia, notamos que a informalização das roupas foi muito maior.”
A informalização dos ambientes corporativos não é um acaso — ela acompanha uma transformação cultural. De acordo com o Deloitte Millennial Survey, as novas gerações valorizam autenticidade, diversidade e liberdade de expressão, inclusive por meio da roupa. Isso tem incentivado empresas a flexibilizar o dress code e rever padrões tradicionais de imagem.
Estudos também indicam que fatores não verbais — como aparência e linguagem corporal — têm forte influência sobre as impressões que causamos. Uma pesquisa amplamente citada do psicólogo Albert Mehrabian sugere que até 55% da comunicação interpessoal pode estar relacionada a sinais visuais. Já outro estudo, da Universidade de Princeton, mostrou que pessoas formam impressões sobre credibilidade e competência em menos de um segundo após ver um rosto.
Segundo Graice, a análise da imagem deve considerar sempre o conjunto, e não apenas uma peça isolada. “O tênis, por exemplo, veio pra ficar. Algumas empresas absorveram isso de forma natural, enquanto outras ainda têm receio. Mas é possível adaptar. Temos opções de tênis que são mais tradicionais. É sobre alinhar a expectativa da empresa com a sua própria intenção de imagem.”
A adequação visual pode variar bastante conforme o tipo de empresa. Em ambientes mais tradicionais, um visual formal tende a transmitir maior seriedade. Já em startups e setores criativos, autenticidade e estilo pessoal podem ser mais valorizados. Graice pontua que, mesmo nesses casos, é possível equilibrar personalidade e profissionalismo. “Às vezes, o candidato é super criativo e entra em uma empresa mais conservadora. Ele não vai deixar de ser quem é, mas pode se adaptar, ficando um pouco mais formal. Podemos trabalhar tecidos, cores e acessórios para expressar sua essência.”
Além da escolha de roupas, fatores como cores, caimento, tecidos e até acessórios contribuem para reforçar uma imagem profissional. Com o olhar técnico de um consultor de imagem, esses elementos podem ser ajustados para expressar características como confiança, dinamismo e modernidade — de acordo com o objetivo de carreira de cada pessoa.
“Quando faço o detox de guarda-roupa com as minhas clientes, costumo dizer que a gente não é só uma pessoa o tempo todo”, afirma Graice. “Então não vou tirar todas as camisas sociais e deixar só um estilo no guarda-roupa. Mas a gente ajusta o que for preciso para que o armário reflita mais a realidade da pessoa.”
Para ela, entender o próprio estilo, as exigências da empresa e o clima local são passos importantes. “Aqui no Brasil, que é muito quente, vale a pena pensar em outros tecidos e caimentos. Não se trata de padronizar ou colocar todos no mesmo blazer ou na mesma calça. Se for o desejo da pessoa ser tradicional e isso estiver alinhado com a empresa, ótimo. Mas é essencial trazer a personalidade para a forma como nos vestimos.”
Na busca por uma nova colocação, esse conjunto visual pode ser decisivo. Afinal, ele fala por você antes mesmo que suas palavras o façam. “Vestir-se é uma forma de comunicação não verbal — e, mesmo que alguém diga que não liga pra isso, acaba sendo importante em como comunicamos nossa imagem”, diz Graice, “A consultoria não é sobre padronizar ninguém, mas sobre alinhar intenção e contexto”.