Imagine se você tivesse nascido no século XIV numa família de ferreiros ou, quem sabe, com mais sorte, pertencesse a nobreza. Qual seria futuro da sua vida?
Fácil né! Filho de ferreiro, ferreiro serás! O seu destino seria determinado pelo seu local de nascimento (família, região). Era uma sociedade estática, governada e justificada por ¨leis divinas¨. A luta era para ter algo para comer, lenha para se aquecer, sem nenhuma expectativa de ascensão social ou riqueza a acumular. Essas oportunidades eram acessíveis somente a uma pequeníssima parte da população.
Como tudo na vida tem dois lados, ela trazia alguns confortos para os excluídos.
Em primeiro lugar, você não seria responsável por seu destino. Ele já havia sido definido e você não precisa sentir-se culpado por ser um miserável ferreiro. Aliás, todos ao seu redor seriam miseráveis, portanto, não haveria uma base de comparação que o fizesse se sentir um perdedor. Não é no meio da pobreza que você se sente pobre, mas em contato com a riqueza.
Acordamos desse sonho ruim e estamos de volta ao século XXI. Homem há muito chegou a lua e o espaço é a nova fronteira. Já alteramos e controlamos o ciclo do nascimento, criamos seres em laboratórios, criamos inteligência artificial. Este tal de destino já não é mais uma fatalidade. Somos nós que o fazemos! Yes, we can!
Sim, você pode ser tudo que quiser. Só depende de você, do seu esforço, apregoam os profissionais que vendem fórmulas prontas para o sucesso!
Junto com os ventos da liberdade proporcionados pelo desenvolvimento tecnológico, também vieram as sementes da ansiedade e angústia. O grito dos anos 60, ¨é proibido proibir”, deixou de ser só um slogan.
As possibilidades se multiplicam, histórias de sucesso povoam as redes sociais e se tornam fluidas. E, como diria Bauman, vivemos numa modernidade líquida.
Soma-se a tudo isso o comportamento de uma geração pouco acostumada com frustração, criadas num ambiente artificialmente protegido onde há pouca relação entre esforço e recompensa.
A combinação de excesso de possibilidades, altas expectativas e intensa exposição através das redes sociais terminou por gerar uma pressão pelo sucesso, seja lá como ele fosse definido. Por outro lado, a baixa resiliência não permite que os ciclos se completem, matando a possibilidade do amanhã antes do anoitecer.
O sentimento íntimo de fracasso e frustração, diante de um mundo de possibilidades, cria um gosto amargo e uma vontade de fugir deste mundo. Fica um vazio, uma saudade melancólica do que poderia ter sido.
Talvez seja o momento de pararmos e refletirmos que é a dose que diferencia remédio do veneno. É a hora de focarmos nas questões que estão sob nosso controle e fugirmos da tentação de nos dispersarmos olhando o jardim do vizinho.
Vender que você pode tudo é esconder diferenças sociais, econômicas e psicológicas que fazem esta corrida ser desigual desde a largada.
Sim, devemos e podemos superar nossos limites, mas isso é uma luta. E, como toda batalha, não há garantia de vitória e o aprendizado advindo de uma derrota é o maior trunfo que você terá para alcançar a vitória.
A vida não é uma dicotomia entre sucesso e fracasso. Elas são parte de um mesmo processo!