As reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, que reúnem líderes financeiros globais esta semana em Washington, foram abruptamente dominadas por uma nova e intensa escalada na guerra comercial entre Estados Unidos e China. O presidente dos EUA, Donald Trump, ameaçou impor tarifas de 100% sobre as importações chinesas na última sexta-feira, mergulhando os mercados em um novo período de turbulência.
A súbita quebra da frágil trégua de cinco meses entre Washington e Pequim ofuscou a agenda original dos chefes do setor financeiro, que se preparavam para debater a resiliência da economia global. A principal questão que agora pauta as discussões é se a promessa de Trump de retaliação — motivada por controles de exportação de terras raras chinesas — levará as duas maiores economias do mundo a um conflito comercial total.
Até a última semana, o cenário era de otimismo moderado. A redução das tarifas, que haviam atingido níveis de três dígitos, levou o FMI a melhorar as perspectivas de crescimento global. A expectativa de um encontro entre Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, neste mês alimentava a esperança de um degelo nas relações. No entanto, na sexta-feira, o otimismo foi abalado quando Trump ameaçou cancelar a reunião e impor um “forte aumento” nas tarifas, além de outras contramedidas.
A situação se deteriorou ainda mais com a decisão da China de retaliar diretamente as novas taxas portuárias dos EUA. Pequim igualou as taxas portuárias norte-americanas para navios construídos ou de propriedade chinesa com suas próprias taxas sobre embarcações construídas ou com bandeira dos EUA, ou ainda aquelas pertencentes a empresas com mais de 25% de capital de fundos de investimento domiciliados nos EUA.
As ameaças de Trump tiveram um impacto imediato, provocando a maior liquidação de ações dos EUA em meses e elevando a preocupação de investidores e autoridades, que já monitoravam a volatilidade de um mercado acionário impulsionado pelo boom de investimentos em inteligência artificial (IA).
Analistas alertam para o risco da escalada. Martin Muehleisen, ex-chefe de estratégia do FMI e atualmente no Atlantic Council, sugeriu que as ameaças de Trump podem ser uma tática de negociação. “Esperemos que a sanidade prevaleça. Se Trump voltar a impor tarifas de 100% sobre os produtos chineses, ele enfrentará fortes turbulências nos mercados”, afirmou Muehleisen, embora reconheça que não é do interesse de Pequim mergulhar novamente em um ambiente de tarifas de três dígitos, apesar da vantagem que o país tem em seu domínio global de terras raras.
Antes desta nova crise, a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, havia elogiado a capacidade da economia global de resistir a choques como incertezas tarifárias, desaceleração do mercado de trabalho e as rápidas transformações da IA. Em uma prévia do relatório Perspectivas Econômicas Globais, que será divulgado na terça-feira, Georgieva havia projetado um crescimento do PIB global para 2025 apenas ligeiramente abaixo dos 3,3% de 2024. Em julho, o FMI já havia revisado sua previsão de crescimento do PIB de 2025 para 3,0%, citando taxas tarifárias menores do que as inicialmente temidas.
“O que estamos vendo é uma resiliência comprovada no mundo”, disse Georgieva à Reuters em entrevista, ressalvando que este é um momento de “incerteza excepcional, e os riscos negativos ainda dominam a previsão. Portanto, cuidado, não fique muito confortável.”
Apesar da importância do tema, não foi confirmado se o Secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, que lidera as negociações comerciais, terá encontros bilaterais com autoridades chinesas durante o evento em Washington. Um porta-voz do Tesouro se recusou a comentar a agenda de Bessent.
*Com informações da Reuters