Seringueiros avançam na criação de coletivo para fortalecer a cadeia da borracha nativa

Katarina Silva - WWF-Brasil

Antes desvalorizada e sem viabilidade, a cadeia da borracha nativa amazônica tem se reerguido nos últimos anos. Um dos atores mais importantes nesse processo é o projeto “Juntos pela Amazônia – Revitalização da Cadeia Extrativista da Borracha”. A iniciativa, que colabora para o aumento da renda, o fortalecimento da sociobioeconomia e a conservação da floresta, também apoia os seringueiros na formalização de um coletivo e na construção de uma carta oficial reivindicativa.

Os avanços são fruto de um encontro realizado no início de setembro, durante a II Semana da Sociobiodiversidade, em Brasília (DF). O momento reuniu parceiros estratégicos, associações produtivas e lideranças de territórios que integram o Coletivo Borracha Nativa da Amazônia, principalmente do Amazonas, Rondônia e Acre.

A analista sênior de conservação do WWF-Brasil e ponto focal da borracha na região, Natasha Mendes, celebra as conquistas. “Foi muito importante porque conseguimos consolidar a quarta reunião do Coletivo Borracha Nativa da Amazônia e estruturar melhor a governança, definir os grupos temáticos e a forma como a plenária se reunirá. Também tiramos alguns encaminhamentos, como a construção de uma carta com as reivindicações do coletivo e os próximos passos para adesão de novas organizações que também produzem borracha na Amazônia”, destaca.

O coletivo nasceu durante a I Semana da Sociobiodiversidade, em 2023, com o objetivo de representar os interesses de seringueiros da região. Desde então, Mendes explica que o apoio se deu em diversas frentes para potencializar a produção da borracha, como acesso a crédito para associações produtivas, melhorias técnicas de produção e conexão com empresas compradoras da safra.

Jhanssem Siqueira, analista de sustentabilidade no Memorial Chico Mendes (MCM), uma das instituições parceiras do projeto, destaca o valor da participação de seringueiros na II Semana da Sociobiodiversidade.

Ao lado de povos tradicionais, organizações da sociedade civil e lideranças da Amazônia, eles colaboraram na elaboração de uma carta para representantes do Governo Federal com diversas propostas para fortalecer as economias da sociobiodiversidade. Entre elas, a borracha.

“As pessoas que estão debaixo da árvore são quem fazem a conservação e a preservação dos recursos da fauna e flora. […]. Esperamos que os representantes públicos leiam a carta, para que nós consigamos resgatar esse produto tão importante da sociobiodiversidade e planejar um terceiro ciclo com dignidade e respeito ao trabalho dessas pessoas”, afirma.

Quem atua em defesa da cadeia é Marilurdes da Silva, representante da Central das Associações Agroextrativistas do Rio Manicoré (CAARIM). Ela está na luta pela valorização da borracha há mais de 18 anos e agora enxerga um novo tempo para o seu território.

“Antes as pessoas cortavam a seringueira e o preço era muito baixo. Hoje, está trazendo uma expectativa de melhoria para a produção e para os seringueiros. Muitos estavam inativos e agora estão voltando [às atividades], e o nosso propósito é que aumente o número de seringueiros na região com essa expectativa de melhoria na qualidade de vida e da floresta em pé”, compartilha.

Apesar do cenário otimista, ainda há desafios estruturais a serem superados, como dificuldades logísticas e climáticas, ausência de uma usina de beneficiamento da borracha no Amazonas e a emissão do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF) e da Carteira do Produtor (CP).

José Roberto, presidente da Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do Município de Pauini (ATRAMP), município a 1.054 quilômetros da capital amazonense, pontua, entre outros assuntos, que hoje um dos maiores entraves é o acesso a linhas de crédito.

“Ainda encontramos muitos desafios no financiamento por bancos públicos. Dependemos muito do capital de giro por sermos pequenas organizações da sociedade civil (OSC), e são poucas as empresas que estão comprando a produção”, pontua.

Para ele, a ampliação da subvenção (em nível federal, estadual e municipal) é uma medida importante, mas destaca principalmente a criação de políticas específicas para as cadeias produtivas da sociobiodiversidade.

“Muito se fala na cadeia das questões socioprodutivas para a conservação ambiental, mas nos territórios ainda não chegam os benefícios disso. Precisamos de políticas efetivas que possam garantir essa cadeia produtiva, sua comercialização e geração de renda nas comunidades mais distantes”, finaliza.

Agora, o próximo passo é seguir com os encaminhamentos estabelecidos, a devida formalização do coletivo e a construção de uma carta oficial reivindicativa, para que “esse coletivo seja representativo e traga a força do território e de suas reivindicações políticas”, frisa a analista do WWF-Brasil.

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