TÊNIS OU FRESCOBOL?

Esse título é de uma crônica do Rubem Alves, de quem sou um admirador. Ele nos explica que esses dois esportes por usarem raquetes e bolas podem parecer semelhantes, mas são profundamente distintos porque tem objetivos totalmente diferentes.

No jogo de tênis, o objetivo é marcar ponto, vencer o game, o set, enfim, derrotar o adversário e encerrar a partida.

Por outro lado, no frescobol, o objetivo é manter a bola no ar por mais tempo possível. É evitar que o outro erre, que consiga devolver a bola e que o jogo prossiga e, se possível, não termine. O prazer está em manter a bola no ar, não em derrotar o adversário.

Ele nos diz que os relacionamentos podem ser caracterizados como um jogo de tênis ou um jogo de frescobol. Tal qual como nos respectivos jogos, no relacionamento tipo jogo de tênis, há uma disputa para ver quem tem razão, quem será o vencedor. Enquanto que no segundo modelo, o objetivo é alimentar a conversa, apoiar ao invés de criticar e acrescentar novas possibilidades sem negar o que foi colocado pelo parceiro.

Simon Sinek, no seu livro Jogo Infinito, de forma muito visionária aplica esse conceito para mundo corporativo, nos trazendo a diferenciação entre jogos finitos e jogos infinitos. Jogo finitos tem horizonte de tempo definido, os jogadores lutam para, ao final, vencer o jogo. Pode ser a disputa por promoção, por aumento de participação no mercado e assim por diante. Ainda que existam regras e convenções conhecidas e aceitas pelas partes, isso não implica que elas serão observadas.

Uma das consequências dessa prática é a dificuldade de construir relação de confiança entre os jogadores, pois quando os players atuam focados somente nos resultados de curto prazo, esse conceito perde relevância. Primordial é ganhar hoje.

No jogo infinito, os jogadores, tal como no frescobol, atuam para manter a partida, não há uma linha de chegada, o objetivo transcende a vitória imediata, o foco é na construção de um propósito que permaneça no tempo.

Para se construir relações de longo prazo, um item fundamental é a confiança entre os participantes, e ela precisa estar alicerçada em dois pilares simultaneamente: comportamento ético e competência técnica. Sem um desses elementos, sempre haverá dúvidas que consomem tempo, retardam as decisões, perda de oportunidades e aumento de custos.

A ciência tem trazido boas notícias sobre a longevidade. Viver 120 anos não é mais um sonho, será realidade para as novas gerações que estão vindo.

Mas tudo tem dois lados. Nossa imagem atual de vida está muito influenciada pelos valores de quando a expectativa de vida média era inferior a 70 anos. Num contexto onde a aposentadoria acontecia após 35 anos de contribuição, ou seja, alguém que começou contribuir aos 20 anos, poderia se aposentar aos 55 anos *.

Agora imagine a situação na qual as pessoas poderão viver até os120 anos!

Não há sistema previdenciário, muito menos cálculo atuarial, que suporte um sistema previdenciário baseado em contribuições definidas e benefícios indefinidos onde alguém que tenha começado a contribuir aos 20 anos, trabalha até 70 e vai receber o benefício da aposentaria por 50 anos, ou seja igual ao seu período de contribuição. Não há aplicação financeira que resolva essa equação. A única certeza que podemos ter no momento é que, no longo prazo, este sistema do jeito que está, não fica!

O aumento da expectativa de vida traz a necessidade de repensarmos vários paradigmas que nos cerca(va).

Com certeza, os mais jovens trabalharão muito mais tempo que seus pais. Com a velocidade das transformações, será vital uma formação continua, cuidar da saúde física e mental será fundamental para manter qualidade de vida e a produtividade no longo prazo. O universo de relações profissionais e pessoais será muito mais extenso, sem falar dos desafios de manter um relacionamento a longo prazo. É escolher entre tênis/jogo finito ou frescobol/jogo infinito.

Se antes, a escolha entre jogo finito e o infinito pudesse ser somente uma questão de posicionamento ético, no atual contexto, ser ético se revela ainda mais enriquecedor.

*no caso antes da última reforma, considerado gênero masculino e somente fator tempo de contribuição

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