Recentemente (01/0825) a UOL veiculou a notícia segundo a qual “Trump demite chefe de estatística após relatório de emprego mais fraco do que o esperado”. Tal fato me trouxe à lembrança o salto de Tibério.
Tibério Cláudio Nero César foi imperador romano de 14 d.C. até 37 d.C. e, por tempos, governou Roma a partir da ilha de Capri, ao sul da Itália. Diz a lenda que quando o imperador recebia notícias que o desagradavam, costumava jogar o mensageiro pelo penhasco, situado ao lado do seu palácio. Este penhasco, hoje uma atração turística, ficou conhecido como Salto de Tibério.
A prática de culpar o mensageiro por notícias desfavoráveis vem de longa data, sendo fácil imaginar os danos que daí decorrem.
É da natureza humana que as pessoas esperem acolhimento e aprovação. Críticas, ainda que construtivas, não são de assimilação fácil. Penso que entre as possíveis razões estão a arrogância e a soberba, que muitas vezes são usadas para disfarçar a sua própria insegurança. Quem tem convicção do seu conhecimento e está em busca de aprimorar o seu conhecimento, não tem problemas em lidar com a crítica construtiva, na qual percebe oportunidade para aprofundar ou corrigir o seu conhecimento.
Mas muitos não têm estrutura emocional para admitir sua falta de conhecimento e, em consequência, lidar com o contraditório. Agora, imagine que pessoas com esta característica estejam em posições de liderança na organização.
Quando alguém se percebe trabalhando num ambiente onde poder e autoridade são sinônimos, os colaboradores ativam instintivamente o modo sobrevivência, evitando tecer comentários e críticas que possam ser mal interpretadas pela liderança.
Num ambiente dominado pelo espírito do imperador Tibério, é natural evitar ao máximo ser portador de uma notícia ruim, ainda que, para isso, tenha que omitir informações e/ou observações sobre alguma inconformidade.
Alguns poderão ficar indignados e argumentar que ser omisso não é ético, no que estarão corretos. Mas os conceitos de ética e moral são criações humanas milhões de anos posteriores ao desenvolvimento do nosso cérebro.
A função primordial do cérebro é garantir a sobrevivência, ao que chamamos de instinto de sobrevivência, que é muito anterior ao desenvolvimento do córtex pré-frontal, que por sua vez é a parte do cérebro responsável pelas funções cognitivas complexas e controle emocional, entre outras . Se deixado ao modo instintivo de agir, prevalecerá o instinto de sobrevivência primitivo e assim evitarão ao máximo serem portadores das notícias ruins.
A boa notícia é que os “instintos” podem ser “domesticados”.
Como disse, a função básica do cérebro é garantir a sobrevivência, assim ele evitará qualquer coisa que seja percebido como um risco, por exemplo, os questionamentos quando estes não são bem vindos.
Se quisermos uma entidade ou um setor participativo e inovador, que se desuaque pela sua criatividade e geração de novas soluções, precisaremos criar um ambiente onde os questionamentos e críticas não sejam percebidos como fatores de risco, mas de destaque e premiação. É criar um sistema de incentivo que premie o comportamento participativo e corresponsável.
É criar uma forte cultura de confiança com base num diálogo transparente entre todos os níveis da organização e com o público externo (fornecedores e clientes) e ,assim, reduzir o risco de reviver a “fábula do Rei Nu”. Mas é preciso coragem, disposição e desapego, pois a tentação do exercício do poder bruto é muito grande.
Na complexidade do mundo atual, mais do que nunca a mudança é permanente, dissociar poder e autoridade é necessário e aprender com o contraditório é essencial, pois a realidade é mais forte e sempre sobrevive à morte do mensageiro.