A organização internacional de proteção animal Animal Equality organizou na semana passada uma reunião em São Paulo com a Eurodeputada Saskia Bricmont, para debater os impactos que a ratificação do Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e União Europeia terá sobre os animais criados para alimentação humana. A reunião foi liderada pela deputada federal Professora Luciene Cavalcante (PSOL-SP). O evento contou com a presença de representantes de organizações de proteção animal.
O Acordo Mercosul-União Europeia foi discutido pelos blocos durante duas décadas até ser assinado em 2019. Desde então, vem sendo alvo de inúmeras críticas, especialmente por causa do potencial aumento das exportações de commodities, carne bovina e de frango para a Europa.
Devido às críticas e aumento do desmatamento no Brasil, no período do governo Bolsonaro, o Parlamento Europeu suspendeu o processo de ratificação do acordo até que medidas fossem colocadas em prática para mitigar os possíveis riscos. Por causa disso, representantes dos dois blocos estão negociando desde 2022 um protocolo adicional que complemente o acordo. Entretanto, organizações de proteção animal e ambiental argumentam que o texto do tratado e do protocolo adicional não são suficientes para impedir suas consequências negativas para os países do Mercosul.
A Eurodeputada Saskia Bricmont —representante da Bélgica no Parlamento Europeu— veio ao Brasil em uma delegação oficial e aproveitou a oportunidade para se encontrar com representantes de organizações ambientais e de proteção animal para debater as consequências do acordo. A parlamentar ressaltou que o mecanismo de reequilíbrio previsto pelo acordo poderá impedir avanços legislativos, ambientais e de proteção animal, tanto no Brasil, quanto na Europa, pois a parte afetada negativamente pelos avanços poderá denunciar a mudança, alegando prática desleal de comércio. “Este é um acordo comercial que trará inúmeras consequências negativas, especialmente para o setor agropecuário, para o meio ambiente e o bem-estar animal. As realidades podem ser diferentes, mas as preocupações são compartilhadas em ambos os lados, pelos próprios pecuaristas europeus”, afirmou Bricmont.
A Deputada Federal Luciene Cavalcante também manifestou preocupações sobre as consequências negativas do Acordo Mercosul-União Europeia para os animais e o meio ambiente e ressaltou que é necessário especial atenção para o tema das exportações neste momento em que se discute o aumento das tarifas de importação aos produtos do Brasil comprado pelos Estados Unidos, pois os animais também poderão ser afetados negativamente. Luciene também ressaltou que o Brasil, por seu protagonismo nas exportações de animais, tem capacidade para inovar e implementar práticas que reduzam o sofrimento dos animais criados para alimentação humana. “Estamos avançando no Brasil em relação às legislações de proteção aos direitos e ao bem-estar animal, mas é fundamental que todas as pessoas que defendem os animais acompanhem de perto e cobrem os deputados para que se posicionem.” disse a deputada.
Desde 2022, a Animal Equality alerta sobre as possíveis consequências do acordo para os animais criados para alimentação. Além aumento expressivo na exportação de produtos de origem animal —estima-se um crescimento de 20% nas exportações de carne bovina e de impressionantes 250% nas exportações de carne de frango do Mercosul para a União Europeia— o acordo poderá estimular o aumento da produção de bovinos em sistema de confinamento, pois oferece tarifa zero para produtos à base de animais alimentados com grãos. O acordo também não possui nenhuma cláusula para impedir práticas cruéis já banidas na União Europeia, como por exemplo, o uso de gaiolas de bateria na produção de ovos. Esse cenário representa a intensificação da exploração e do sofrimento de milhões de animais para atender à nova demanda.
Carla Lettieri, Diretora Executiva da Animal Equality destacou que namaioria dos países do Mercosul, o foco está na questão sanitária. “Nestes países os animais são vistos como produto que precisa ser higienizado para chegar à alimentação humana, mas sua dignidade e proteção são ignoradas. Práticas que já foram banidas na União Europeia ainda são o padrão da indústria nestes países”, afirmou.
Em junho, a Animal Equality lançou, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, o relatório “Consequências do Acordo de Livre Comércio Mercosul-União Europeia na Produção Animal”, no qual são apresentadas as diferenças de legislação entre os blocos sobre proteção animal. O relatório pode ser baixado no site da organização, clicando aqui.